terça-feira, 26 de outubro de 2010

Quebra de Patentes

Por Sílvia Serradilha

Introdução

Desde que os países ficaram obrigados a reconhecer a patente de medicamentos, reivindicado pelo laboratório que bancou as pesquisas para produção dos mesmos, situação que ocorreu após o acordo TRIPS, realizado em 1994, calorosas discussões e disputas de interesses, principalmente quanto ao acesso aos medicamentos para o tratamento do HIV/Aids se instalaram.

Essa legislação acabou por se tornar um entrave aos medicamentos, sendo criticada por ser entendida como um meio de atender mais a interesses comerciais e lucro das indústrias farmacêuticas internacionais do que interesses de saúde pública.

Há anos o Brasil ameaça utilizar a licença compulsória como forma de assegurar a sustentabilidade do programa universal de tratamento de HIV/AIDS, ameaçada pelos altos preços praticados pela indústria farmacêutica. No entanto, apenas em 2007 o governo brasileiro emitiu a primeira – e única – licença compulsória da história do país – para o efavirenz, da transnacional farmacêutica alemã Merck.


Posicionamento das indústrias farmacêuticas transnacionais

As transnacionais farmacêuticas buscam impedir a utilização legítima das flexibilidades de proteção à saúde pública permitidas pelo sistema internacional de proteção à propriedade intelectual.

A transnacional farmacêutica Roche (Suiça) é acusada de violar o direito à saúde da população brasileira e a soberania nacional, mediante a tentativa de interferência na legislação interna pelo uso de ação judicial visando à exclusão de uma flexibilidade do sistema de propriedade intelectual que visa à proteção da saúde pública.

A transnacional farmacêutica Boehringer Ingelheim (Alemã) envolve, além da violação do direito à saúde, o descumprimento às normas de ética em pesquisa. A empresa não havia solicitado no Brasil o registro sanitário de um medicamento que foi testado clinicamente na população brasileira. A ausência de registro sanitário impede o acesso da população ao medicamento, na medida em que impossibilita a comercialização do produto no país

Além da via judicial, as empresas farmacêuticas também atuam em outras frentes tentando deslegitimar as flexibilidades de interesse para saúde. Há fortes indícios de que
o caso da empresa Boehringer Ingelheim no Brasil de não solicitação de registro sanitário de um medicamento, esteja relacionado ao fato de que o pedido de patente para
o produto foi negado devido a não anuência da ANVISA.

Além disso, as transnacionais farmacêuticas ainda pressionam seus países sede para que
imponham retaliações econômicas aos países que utilizem as flexibilidades de interesse
para saúde e também para que se valham de seu poder econômico para negociar medidas ainda mais protetoras de seus interesses comerciais mediante o comprometimento da não utilização das flexibilidades – geralmente por meio de acordos bilaterais de comércio, acatados pelos governos dos países em desenvolvimento, apesar dos impactos que podem causar na formulação de políticas públicas de saúde e no acesso a medicamentos por seus cidadãos.




Licenciamento compulsório e implicações econômicas

O Brasil, com o licenciamento, fica livre para abrir concorrência e comprar de quem oferecer o medicamento pelo preço mais barato. Segundo o diretor do Fórum de ONGs/Aids do Estado de São Paulo, Rodrigo Pinheiro, o país não possui tecnologia para produzir os sais que compõem o Efavirenz, mas fica livre para adquirir os componentes fora e produzir um genérico do medicamento em solo nacional.
"O laboratório estava tentando vender esse comprimido a 1,57 dólar e o governo estava tentando fazer com que se igualasse ao preço da Tailândia, que é de 0,47 dólar. O laboratório não quis fazer essa baixa, então o governo entrou com essa licença compulsória. Isso gera uma economia muito grande para os cofres público", declara Rodrigo.
Inovação tecnológica e sua relação com as patentes de invenção


Art. 3.º Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil:
• (...) II - garantir o desenvolvimento nacional;

Segundo Denis Borges Barbosa, a idéia por trás do sistema de patentes é de incentivar o investimento em inovação; ao discutir a atividade inventiva, a análise econômica do direito de patentes aponta para um tipo específico de inovação para a qual o sistema de patentes é dedicado, que é a inovação.

A exigência de atividade inventiva, numa economia com menor dinâmica inovativa, como é o caso do Brasil, leva a um número menor de patentes de inventores locais, quando comparado ao estoque de patentes de origem estrangeira.

Nesta esteira, apresento notícia divulgada recentemente:

Falta inovação tecnológica da indústria farmacêutica brasileira
Déficit da balança comercial do setor de saúde cresce 55% no ano. Ano após ano, o déficit da balança comercial brasileira na área de saúde cresce e revela uma preocupante dependência do mercado externo para a aquisição de remédios e equipamentos médicos consumidos no país. Na avaliação do Ministério da Saúde, a situação poderia levar a um desabastecimento em caso de forte desvalorização do real.
Para Marcos Ferraz, professor do Centro Paulista de Economia da Saúde da Universidade Federal de São Paulo (CPES-Unifesp), o problema está no lento processo de inovação tecnológica da indústria farmacêutica brasileira. "Conforme cresce a demanda do mercado interno, o déficit comercial cresce, porque a nossa produção ainda é muito pequena e, na maioria das vezes, pouco qualificada, sem diferenciais".



Conclusão

São muitos os desafios a serem enfrentados por aqueles que militam em defesa do acesso a medicamentos e do direito à saúde, frente a este padrão de atuação da indústria farmacêutica em diferentes países do mundo.

É importante que grupos se formem para implantarem as flexibilidades do TRIPS de interesse para a saúde, seja impedindo a concessão de patentes indevidas, seja estimulando a emissão de licenças compulsórias, tendo como desafio, monitorar as práticas abusivas das empresas em seus países.

A troca de informações e experiências entre grupos que atuam nesta área, a fim de que possam ser construídas estratégias conjuntas de enfrentamento a problemas semelhantes e que experiências de sucesso possam ser adaptadas aos diferentes contextos é de fundamental importância para o fortalecimento dos interesses inerentes a saúde pública.





Referências bibliográficas
http://www.brasildefato.com.br/node/755
http://www.abepro.org.br/biblioteca/ENEGEP2007_TR630467_0104.pdf
http://portalteses.icict.fiocruz.br/transf.php?script=thes_chap&id=00004304&lng=pt&nrm=iso
Santos, Sílvio César Machado dos . Melhoria da equidade no acesso aos medicamentos no Brasil: os desafios impostos pela dinâmica da competição extra-preço. [Mestrado] Fundação Oswaldo Cruz, Escola Nacional de Saúde Pública; 2001. 180 p.
http://www.enlazandoalternativas.org/IMG/pdf/5-POR.pdf
http://www.denisbarbosa.addr.com/arquivos/novidades/patente_modelo_aperfeicoameto_inovacao.pdf

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